[3] Existencialismo judaico versus existencialismo cristão

A Estrela da Redenção
2 min readJun 22, 2020

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“Na verdade, se não fosse animador, gostaria de ser pastor. Mas, na minha igreja, eu só ia falar do Velho Testamento. Está tudo lá”.

Sílvio Santos (Veja, 2000)

Ambos os existencialismos judaico e cristão, feitos tanto por filósofos como teólogos, advém de tradições religiosas baseadas na Bíblia, o judaísmo e o cristianismo, respectivamente.

Mas os cristãos têm uma Bíblia maior: ela é composta por ‘Velho’ Testamento e Novo Testamento. Já os judeus têm uma Bíblia menor: é apenas o ‘Velho’ Testamento dos cristãos, que para os judeus não é ‘velho’, mas simplesmente a Bíblia (e o termo mais correto no contexto judaico e interreligioso é Bíblia Hebraica/Bíblia Judaica ou Tanah/Tanakh).

Tanah, edição bilíngue, Editora Sefer

Para a maioria das pessoas em nossa sociedade, a opção por um existencialismo judaico não faria muito sentido (salvo se a pessoa já tivesse nascido judia). A Bíblia não fica incompleta quando só tem o ‘Velho’ Testamento? O Tanakh não seria uma Bíblia incompleta? Se sim, por que discutir existencialismo a partir de uma Bíblia ‘deficiente’?

E ainda pior: a Bíblia Hebraica não seria um livro cheio de violência e ânsia punitivista? A caricatura que muitas pessoas têm (muitos cristãos inclusive, e praticamente todos os neo-ateus) é que o ‘Velho’ Testamento é a época da Lei, de aplicação rígida de punição sem espaço para misericórdia, de um Deus punitivo que fulmina na hora as pessoas se estas discordam dele, de uma moralidade baseada na letra da lei ao invés do seu espírito, de ritualismos sem sentido. Um Deus que escolheu um único povo e condenou todo o restante da humanidade.

E nesse estereótipo, o Novo Testamento teria vindo para consertar isso. Uma religião baseada no amor, na paz, em um Deus misericordioso que perdoa os pecados da humanidade. E mesmo se você não for uma pessoa muito religiosa, no mínimo Jesus era um homem muito sábio e iluminado que inovou ao defender apenas e tão somente o amor entre os homens como a base da religião, ao contrário da ideia ‘antiga’ baseada em ferro e fogo de uma tirania divina.

Como eu penso que muito dos que estão acompanhando essa série provavelmente tem alguns desses estereótipos na cabeça, seja consciente ou inconscientemente, vou dedicar os próximos posts da série a desmistificar o Tanakh/’Velho’ Testamento e por extensão o judaísmo. Será que o modelo de religião da Bíblia judaica (e de sua tradição que a interpretou, os tratados do Talmude) é realmente deficitário e ‘primitivo’ como muitos acham?

O spoiler é que, bem, Sílvio Santos tinha razão nessa.

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A Estrela da Redenção

Releitura existencial da Bíblia Hebraica via existencialismo judaico + tradição judaica e pesquisa bíblica acadêmica. Doutor em Filosofia Valdenor Brito Jr.