[84] Homossexualidade e Bíblia Hebraica 31- Judaísmo Conservador (Masorti)
O judaísmo masorti/conservador concorda com os ortodoxos que a Halacha ainda seja obrigatória para os judeus. Entretanto, esse ramo considera que a Halacha é um sistema evolutivo que não deve ser ‘fixado’, mas sim continuar mudando para refletir o entendimento comunitário para dada época.
Aqui a ideia é lidar com a modernidade não apenas reativamente como os ortodoxos, mas sim tomar à frente nessa tarefa. Isso seria realmente honrar a tradição, pois continua o que ela já fez diversas vezes no passado.
Para tanto a Halacha conservadora é composta pela Halacha clássica (que os ortodoxos também aceitam) mais as várias diretivas (Responsa) emitidas pelo Comitê de Lei e Padrões Judaicos da Assembleia Rabínica atualizando a jurisprudência clássica pelo estabelecimento de novos precedentes jurisprudenciais.
Aqui usa-se tanto o raciocínio jurisprudencial baseado nos precedentes da Halacha (método clássico) como modernas ferramentas histórico-críticas para analisar a Bíblia e o Talmude (método acadêmico).
Sobre a questão da homossexualidade, o judaísmo conservador/masorti se pauta na Responsa Combinada dos Rabinos Elliot N. Dorff, Daniel S. Nevins e Avram I. Reisner aprovada pelo Comitê de Leis e Padrões Judaicos em 2006. Essa Responsa é muito interessante por ser um procedimento de Halacha (jurisprudência), revisando o entendimento da Halacha clássica no sentido de:
- Manter a restrição bíblica ao sexo anal entre 2 homens [o mesmo ocorre na Halacha clássica];
- Revogar todas as demais restrições existentes a práticas homoeróticas, as quais foram instituídas rabinicamente, não biblicamente [aqui mudou a Halacha clássica].
Assim, dentro da Halacha conservadora, são permitidas todas as práticas homoeróticas que a própria Torá não proíbe. Apenas permanece a proibição bíblica de Levítico 18:22, que versa exclusivamente sobre a prática de sexo anal entre homens.
Deve-se destacar que não é impossível que mesmo a proibição bíblica venha a cair também. Mesmo na própria ortodoxia isso seria possível em tese. Contudo, tanto na ortodoxia como entre os masorti, seria necessário um decreto rabínico (takkanah) para fazer cair uma proibição bíblica. Dentro do procedimento do judaísmo conservador, referido decreto não teve quórum suficiente para ser emitido na ocasião da Responsa referida acima.
Outro ponto importante sobre essa Responsa é que ela não foi a única adotada em 2006 pelo Comitê de Leis e Padrões Judaicos da Assembléia Rabínica. Na verdade, foram duas os Responsum adotados: o que já falamos e o do R. Roth, este último mantendo as determinações da Halacha clássica (ou seja, igual à ortodoxia).
A razão para endossar dois Responsum diametralmente opostos é que isso permitiria cada comunidade do movimento conservador de adotar qual posição lhe pareça mais correta: a que retira os requerimentos rabínicos às práticas homoeróticas que não seja o sexo anal entre homens, ou a que os mantém.
Em 2012 outra Responsa combinada dos Rabinos Elliot N. Dorff, Daniel S. Nevins e Avram I. Reisner estabeleceu diretrizes para a realização do casamento homossexual judaico nos contornos da Halacha conservadora. Tal como vimos no post anterior sobre rabinos ortodoxos modernos que realizam casamentos homossexuais, a cerimônia usada aqui não é o kidushin usado tradicionalmente para casar pessoas de sexo diferentes.
Nos próximos posts discutirei a fundamentação usada por ambas as Responsum combinadas dos R. Dorf, R. Nevins e R. Reisner, tanto a de 2006 referente às relações homoeróticas quanto a de 2012 referente ao casamento homossexual, para que entendamos melhor sob quais bases de Halacha foi possível instituir uma postura menos restritiva à questão homoafetiva no contexto do judaísmo conservador/masorti.
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