[139] Lendo os Profetas Naum e Jonas
Como ler os Profetas Bíblicos? A grande maioria das pessoas que já tiveram algum contato com a Bíblia Hebraica (vulgarmente conhecida como “Velho” Testamento) fogem dos chamados livros proféticos, um conjunto de 15 livros nomeados cada um a partir do profeta cujas mensagens e poesias foram ali compilados.
Por conta dessa relutância, perde-se uma grande chance de se aprofundar num dos tipos mais interessantes de literatura não somente bíblica, mas de grande peso existencial humano. O leitor que acompanhou os textos mais recentes do blog certamente deve lembrar que eu fiz muitos posts a respeito do Profetismo Israelita Clássico (veja posts [17]-[18]-[19]-[20]-[23]-[24]-[25]-[26]-[30]-[31]-[32]-[33]-[34]-[35]-[36]-[37]-[38]-[39]-[40]-[41]-[44]-[45]-[46]-[47]-[48]-[112]-[121]-[132]-[134]).
O objetivo desse e dos próximos posts é mostrar como ler os Profetas, a partir de um estudo de caso, com uma dobradinha entre 2 Profetas: Naum e Jonas. No presente texto, eu farei uma introdução aos 2 Profetas mencionados. Nos 2 próximos textos, tratarei primeiro de Naum isoladamente e depois de Jonas isoladamente. O quarto e último texto conectará ambos em uma leitura conjunta.
Uma das vantagens desses 2 livros para o leitor iniciante aos Profetas é que ambos são bem curtos. Naum é composto por apenas 3 capítulos e Jonas por 4 capítulos. Além disso, ambos são bem diretos ao ponto: Naum em termos do discurso feito por ele por ocasião da queda iminente de Nínive, capital do Império Assírio, e Jonas em termos da lenda ou parábola a respeito de como esse profeta teria ido até Nínive anunciando sua destruição, com uma enorme consequência para o destino dessa cidade imperial.
Um ponto importante é que quase todos os Livros dos Profetas são compilações das mensagens e poesias ditas por esses Profetas enquanto atuaram falando ao povo, às elites e aos governantes. Sua escrita começou no próprio tempo de vida de cada profeta (muitas vezes pela pena do próprio profeta em questão) e foi finalizada pouco depois da vida do profeta em questão por meio de escribas interessados em registrar tais poemas e discursos.
Mas a exceção maior a essa regra geral é o livro de Jonas. Aqui não vemos quase nada da pregação de Jonas escrita em poesia (fora um salmo e um enunciado profético muito curto), mas principalmente uma história sobre Jonas escrita em prosa. Essa história pode ser entendida seja como uma lenda seja como uma parábola deliberada tendo Jonas como personagem.
O motivo é que os registros históricos das dinastias de Israel e de Judá constantes na Bíblia Hebraica (livro dos [1–2]Reis e livro de [1–2]Crônicas), que versam sobre o mesmo período de tempo no qual Jonas é ambientado, não mencionam o relatado em Jonas 4 (que, como veremos, se tivesse realmente acontecido, não deixaria de estar refletido nos livros bíblicos que se propuseram a de fato registrar a história acontecida no Antigo Israel).
Então, é mais lógico que o escritor do livro de Jonas conhecesse os fatos históricos relevantes, mas tenha decidido por fazer um exercício em história contra-factual, talvez aproveitando alguma lenda a respeito da ida do profeta Jonas à Nínive.
Assim, o leitor não deve se preocupar com a questão da historicidade de Jonas. Isso simplesmente não é relevante nos termos do próprio livro em questão.
Já Naum segue o padrão geral e é histórico. Nós inclusive conseguimos datar com muita precisão quando a poesia desse livro foi escrita, por conta dele se referir à queda de Nínive. Por isso temos praticamente certeza que o livro foi escrito antes de 612 AEC (antes da era comum), há mais de 2.632 anos atrás, e, por conta de eventos que o livro retrata, depois de 668 AEC (ocasião da queda de Tebas mencionada pelo Profeta). Schokel e Diaz datam esse livro por volta de 668 e 654 AEC, durante o Reino de Manassés em Judá.
O livro de Jonas é retratado antes dessa época, em algum período do século 8º AEC. O Jonas histórico atuou provavelmente por volta de 786 a 746 AEC (veja 2Reis 14:25), mas não sabemos se ele atuou para além desse tempo e nem qual período de tempo exato o livro de Jonas o coloca. Já o livro em si provavelmente foi escrito apenas após o retorno do exílio babilônico,provavelmente depois de 500 AEC, e com certeza bem antes de 200 AEC, uma vez que nessa data ele já estava há muito consagrado entre os Profetas. Então, podemos datar esse livro entre 500 e 300 AEC.
No próximo post abordarei primeiramente qual a mensagem do livro do Profeta Naum.
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